27 dezembro 2011

Há quase 11 anos

Pela quarta vez na vida deixei Pipa/RN. É sempre uma sensação de nostalgia que bate a medida que me afasto desse lugar, mas por outro lado considero um simples 'até breve'. Pipa é espiritualmente forte pra mim.

Saí da cidade com destino a João Pessoa/PB e a viagem começou numa van que me levou até a cidade de Goianinha, de onde eu pegaria um transporte para a capital paraibana.

Quando entrei na van eu era o único passageiro, porém alguns metros a frente entrou um casal de gringos, cujo idioma era indecifrável, mas com certeza era algo de origem germânica, nórdica ou escandinava. Eles estavam indo a Tibau do Sul para praticar kite surf.

Assim que eles entraram, o cobrador, num português escandinavamente incompreensível, explicou-lhes que eles subiram fora da parada permitida, o que poderia gerar multa. O atencioso cobrador até mostrou o fiscal parado na calçada. A mulher entendia português e falava 'um poquinho', como ela mesma me disse depois, mas não sei se compreendeu a lição do cobrador, porém mesmo assim explicou ao companheiro, em seu idioma nativo, e apontou com o dedo para uma placa de parada obrigatória.

Já na saída da cidade, o cobrador mostrou um campo de futebol aos gringos, falou algumas palavras, não sei em qual português, e no meio citou o nome Ronaldinho, o casal pensou que o craque havia jogado naquele campo, mas o cobrador disse que não, que o camisa 10 o Flamengo só pensa em dinheiro e jogava bem longe dali, no Rio de Janeiro. O gringos balançaram a cabeça.

A terceira intervenção veio para dizer aos gringos que eles poderiam usar a prancha do kite para surfar nas dunas. O casal não entendeu nada, tentei ajudar, mas demorei para compreender a palavra 'areia'. Após os gestos efusivos do cobrador, os gringos falaram: "sand board!, oh yes".

Depois que o casal desceu, subiu mais a frente um grupo de senhoras e duas delas se sentaram ao meu lado. Uma delas começou a reclamar do sobrinho que havia começado a tomar cerveja à 8h da manhã, e que desde a última sexta não parava de beber (estávamos numa terça).

Daí em diante, ela e a amiga começaram a criticar o consumo desenfreado de álcool. Criticaram também as pessoas que só gostam de farras, pois só se lembram de Deus quando estão enfermos numa cama e quando têm saúde não frequentam nenhuma missa.

Uma delas até comentou que gosta de uma caipirinha, mas em ocasiões especiais, enquanto que a outra informou sobre o seu próprio limite: "até dois copinhos de cerveja ainda vai..."

Por outro lado, a comilança está liberada. Ambas comentaram sobre a fartura de comida que consumiram nas festas de natal e o quanto são bons esses momentos para degustar tudo que é servido na mesa. Falaram de carnes, churrasco, leitão, etc, etc, etc

Desceram da van falando de comida.

A próxima passageira que sentou ao meu lado foi uma senhora acompanhada da neta adolescente. Elas estavam vindo da missa de quatro anos de falecimento de um amigo da avó.

O cobrador simpático e com olhos doces pra cima da jovem voltou a entrar em ação, perguntou à senhora se a garota era filha ou neta. A resposta foi bem poética: "ela é filha e neta". Curioso, o cobrador emendou outra pergunta para saber se a mãe ou o pai da garota era filho da senhora, esta respondeu: "o pai dela era meu filho".

O 'era' me chamou a atenção, olhei para a menina de corpo bem franzino e percebi seus olhos distantes, ela parecia alheia a toda aquela conversa. A avó elogiou a neta, que é bem calma, não gosta de sair e provavelmente vai puxar tanto o pai quanto à mãe, ambos eram caseiros e nunca estavam em farras.

Com uma voz triste, a senhora comentou que mesmo assim o filho foi embora cedo. O cobrador perguntou se foi acidente, a velha responde: "sim, acidente de trabalho, vai fazer 11 anos em fevereiro, essa menina tinha 4 anos na época". Nesse momento ela abaixa a cabeça e fica mexendo com os dedos na bolsinha de pano em sua mão.

Silêncio até Goianinha.

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